quinta-feira, 5 de setembro de 2019

COELHO NETO - REMINISCÊNCIAS

REMINISCÊNCIAS



De quando em quando ressurgem-me na memória lembranças de outras vidas, como em vasos que contiveram essências, servindo a outras posteriormente, aparece, por vezes, o aroma das primitivas.

Se a saudade é vestigio do que foi, essas recordações que se levantam em nós são como poeira de caminhos percorridos.

E quem não a traz em si? Quem não sente, de vez em quando, reminiscências de um passado, que não é o mesmo de onde viemos pelos anos atuais, mas muito mais remoto, um passado d'além do evo em que transitamos?

Essas saudades não jazem no coração, são livres, voam em volta de nós como as nuvens no espaço.

Quem nos diz que elas não são o que já fomos, como as nuvens já foram rios, pântanos, oceanos?

Quem nos afirma que não são lembranças de eras transcorridas, sobre as quais adormecemos quando nos soou a hora noturna, acordando com a madrugada para viver, de novo, ao sol e, de novo, dormir?

Se me recordo do que fui outrora é natural que, mais tarde, me lembre do que sou.

E os dias passarão continuamente e eu voltarei com eles como os minutos voltam com as horas, as horas com os dias, os dias com as semanas, as semanas com os meses, os meses com os anos, os anos com os séculos, enquanto girarem na Eternidade, que é o mostrador do Tempo, infinito, impassível, parado, espelhando a Vida, que é o movimento.



COELHO NETO



Fonte: Livro: A Vida Além da Morte – Coelho Neto – Conferências realizadas no Abrigo Thereza de Jesus, no dia 14 de setembro de 1924.

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